quinta-feira, 12 de junho de 2008

O Corte

Raquel sentou-se em frente a sua penteadeira antiga que pertenceu a sua avó. Sentia o peso do mundo sobre suas costas. O que ela fez foi imperdoável. Jamais sua mãe voltaria a olhar para ela. Seu pai a expulsaria de casa.
Ela já imaginava como seria difícil viver sozinha. Buscar a ajuda de seus parentes não era possível, pois eles apoiariam seus pais. A partir de agora ela deveria cuidar de si mesma, sem a ajuda de ninguém. Até o pastor iria expulsa-la da igreja.
Há poucos meses atrás Raquel completara 15 anos, seus pais fizeram um culto e uma bonita festa. Durante a festa ela reparou pela primeira vez que o novo seminarista da igreja era um rapaz bonito, simpático e tinha apenas 18 anos.
Durante a festa começou a conversar com ele. Raquel percebeu que ele era muito atencioso com ela. Nos meses que se seguiram, em todas as atividades da igreja eles estavam próximos, trocavam sorrisos e olhares.
Todos perceberam que Raquel estava diferente, preocupava-se com as suas roupas, arrumava mais o cabelo, todas as manhãs e noites, escovava um hora os seus longos cabelos. Que agora chegava aos tornozelos.
Na escola ela começou a conversar com as outras meninas a respeito dos meninos. Eram coisas que jamais poderia falar em casa com sua mãe, suas amigas deram muitos conselhos e ela ficou confusa, pois certas coisas iam contra o que ela aprendeu na igreja.
Por certo tempo ela resistiu em pensar naquelas coisas. Mas certo domingo o seminarista a cumprimentou e elogiou sua roupa. Foi a gota d’água. Ela tinha que fazer aquilo para garantir que o seminarista seria seu marido. Ela tinha que fazer do jeito que suas amigas tinha aconselhado.
Hoje pela manhã ela fez! Mas tudo o que fez foi por amor. Foi pelo homem de sua vida. O homem que ela queria para ser seu esposo.
Entretanto, depois de consumado o fato. O remorso se apoderou dela! Como tinha sido estúpida.
Logo todos perceberiam!... mas fez aquilo por amor... como poderia explicar que cortara dez centímetros de seu cabelo para ficar mais bonita...“Ai de vós ... interpretes da Lei! Por que sobrecarregais os homens com fardos superiores às suas forças, mas vós mesmos nem com um dedo os tocais” Lucas 11.46

A fuga

João nunca tinha sentido seu coração bater tão rápido, parecia-lhe que a qualquer momento pularia de sua boca para o chão. Sua boca estava cheia de uma saliva grossa, não era sede, era algo mais profundo, sinistro. Era o inexorável medo de morrer. Suas pernas moviam-se mais rápido do que jamais ela havia pensado que conseguisse. Seu desespero era tamanho que ela corria pelas vielas da favela, subindo e descendo por estreitos caminhos tentando escapar de seus perseguidores.
Quando a policia cercou as entradas da favela, naquela madrugada – “maldita sexta-feira 13” pensou João – Alguém disse que fora ele quem havia ‘dedurado’ a chegada dos produtos. Ao invés das habituais salvas de rojões de fogos de artifícios, o que se ouviu foram os gritos dos policiais. De imediato os companheiros de João se jogaram em cima dele, ameaçando e dizendo que se fosse ele o responsável pela chegada policia seria morto.
Para sua infelicidade, a policia invadiu a favela e em meio aos tiros, gritos e confusão geral, o seu primo Tiago, que era policial, estava na linha de frente. Em absoluto pânico João, percebeu que ‘Chapinha’, o gerente da ‘boca’ também viu o seu primo. De fato, João imaginou que só podia ser muito azar mesmo – “Deus esta contra mim” pensou – logo, seu primo crente, certinho e da policia tinha que dar as caras. Haviam anos que aquele careta tinham saído da favela, virou burguês. E agora como explicar que ele não tinha nada com esta história.
Antes que pudesse imaginar alguma história, viu que Chapinha caminhava em sua direção. De arma em punho, engatilhada. Ele já vira aquela expressão antes. Sabia que seria morto em pouco segundos. Chapinha era capaz disto e muito mais. Sabia que sua morte seria demorada e dolorosa, mais ainda, sua família, sua mãe corria muito perigo.
Sem perceber ele se levantou e correu pela porta da boca. Chapinha gritava, xingava e atirava em sua direção. Ele ouvia o barulho das balas passando de raspão. Jamais imaginou que Chapinha, que era ótimo atirador, daqueles de acertar pardal voando, erraria de tão perto. Para sua sorte errou.
A única coisa que impediu a caçada a João foi a chegada da policia. João deu graças a Deus por isso. E continuou a correr, procurando algum burraco para se esconder. Não demorou muito e estava no terreno da escola. Pulou o muro num salto só. Subiu pelos canos de chuva, e foi se esconder no telhado. De lá poderia ver tudo o que acontecia. E se fosse necessário poderia pular no outro lado para o meio do matagal que ficada nos fundos da favela.
Ali ficou acordado até o amanhecer. Lembrou das vezes que seu primo certinho o chamava para ir para a igreja. Também lembrou das diversas vezes que, de manhã, ao entrar em casa, via sua mão de joelhos chorando e orando.
João decidiu que desde dia em diante mudaria de vida, largaria as drogas e o tráfico, se Deus o livrou das mãos de Chapinha, ele é que não ira desperdiçar sua chance. De agora em dia era um homem novo, correto, até aceitaria Jesus.
Quando o dia clareou e as coisas se acalmaram. Voltou para casa e encontrou com sua mãe ajoelhada. Abaixou-se ao lado dela e anunciou as boas novas. Sua mão o abraçou e oraram juntos. Agradecendo a Deus pela aurora de uma nova vida.
“Ai” Lucas 11.46

segunda-feira, 9 de junho de 2008

Cansaço

Certa vez dois amigos que não se viam há muito tempo, encontraram-se e conversaram longamente. O inicio da conversa foi assim:

- Olá! Camarada! Há quanto tempo não nos vemos! Como vai?
- Bem, mas muito cansado!
- Ora porque está cansado? Trabalhando muito?
- Sim, muito mesmo! Cuido de 2 corujas, 2 gaviões, 2 coelhos, 1 serpente, 1 leão e 1 doente!
- Nossa! Quantas coisas!
- São Muitas mesmo. E ainda tenho que fazê-las todas ao mesmo tempo!
- Ora! Não entendo? Como Assim!
- Veja caro amigo. As duas corujas são os meus olhos que a todo instante precisam ser direcionados para ver coisas boas e luminosas, que irão iluminar minha alma. Os dois gaviões são minhas mãos, que precisam ser direcionadas para não tocar em nada que impuro ou incorreto. Os coelhos, são meus pés, sempre ligeiros, devem ser firmemente domados para nunca se desviar dos caminhos retos da justiça de DEUS. A Serpente por sua vez é a minha língua, tal pequena e capaz de tamanho estrago, uma pequena mordida e causa grande estrago, é pequena fagulha que provoca imenso incêndio. O Leão é o meu coração, que ruje, ameaça e amedronta. Tentando nos afastar da Palavra de Deus. Por fim, o doente é o meu corpo, que é sempre fraco e propenço a cair, a não persistir em nenhuma prática correto.
- Camarada, percebo que necessito olhar para minha vida de um jeito diferente. Com mais cautela.
E assim continuou a conversa....

... Texto inspirado no sermão do Presb. Ricardo Fukusawa, em 8 de junho de 2008, na Igreja Presbiteriana Nova Canaã.

"Rogo-vos, pois, irmãos, pelas misericórdias de Deus, que apresenteis o vosso corpo por sacrifício vivo, santo e agradável a Deus, que é o vosso culto racional. Não vos conformeis com este século, mas transformai-vos pela renovação da vossa mente, para que experimenteis qual seja a boa, agradável e perfeita vontade de Deus. Porque, pela graça que me foi dada, digo a cada um dentre vós que não pense de si mesmo além do que convém; antes, pense com moderação, segundo a medida da fé que Deus repartiu a cada um". Romanos 12.1-3

quinta-feira, 5 de junho de 2008

Igreja Multiplex

O senhor Abel olhava pela janela do ônibus impressionado pela grandiosidade da metrópole. Uma multidão de pessoas, prédios, carros e motos. Após 75 anos vivendo em uma pacata cidade do interior, estar pela primeira vez no meio de toda aquela agitação o deixava zonzo. Tudo era grande. As pessoas corriam ao invés de andar. Ninguém se cumprimentava, nem se quer pediam desculpas por um esbarrão ou tentavam ajudar em alguma dificuldade. Todos se ignoravam mutuamente.
Ao chegar à rodoviária seu filho caçula, o décimo segundo de sua farta prole o esperava. O rapaz estava muito feliz, já passaram quase cinco anos da última vez que esteve com seu pai. Ao seu lado estava o filho e a esposa. O reencontro foi festivo e alegre, apesar da multidão ao redor. Logo foram para o apartamento nas proximidades do centro da metrópole.
O Sr. Abel, além de visitar o filho caçula. Veio para realizar alguns exames médicos. A contra gosto, mas depois de meses de discussões e atormentações da esposa, ele desistiu e achou melhor fazer o que ela falava. Assim veio fazer os tais exames e ficar livre a falação da esposa. E como bônus veria o filho e o neto.
O idoso senhor Abel era crente fiel. Desde sua conversão aos vinte anos sempre foi na mesma igreja. Foi diácono e presbítero. Cantou no coral foi professor na escola bíblica. Nunca faltava aos cultos e atividades da igreja. Na sua pequena cidade a igreja que freqüentava era a mais antiga e tradicional. Por incrível que pareça ainda se lê a Bíblia e o pastor faz longos sermões baseados em textos pequenos, explicando minuciosamente os detalhes do texto.
Durante aquela semana ele fez os exames necessários. No domingo como era seu hábito levantou cedo e se arrumou para ir com o filho a igreja. Para seu desgosto o filho e nora trabalhavam aos domingos, iam à igreja à noite (Quando não estavam cansados) e nos dias de folga. Mas naquele domingo, os dois trabalhariam e o neto ficaria com a mãe de sua nora. Sr Abel foi convidado para ir com o menino, mas preferiu procurar uma igreja ali perto.
Na portaria o filho e o porteiro disseram que há dois quarteirões havia um igreja muito boa. Explicaram como deveria fazer para chegar lá. O Sr Abel perguntou qual era a denominação, infelizmente nem o filho nem o porteiro souberam dizer. O porteiro disse que era algo como “Mênico” ou “ Irmãos Mênicos”.
O Sr. Abel seguiu as instruções e caminhou vagarosamente, com certo medo de se perder. Não foi difícil, em poucos minutos estava em frente à igreja. Se bem que quase não parecia uma igreja – para os conceitos do Sr. Abel – mais parecia um daqueles shoppings que viu ao longo da semana. Chegou próximo a entrada e porta se abriu sozinha – ele ficou impressionado com aquela modernidade e pensou de sugerir uma igual para os anciãos da sua.
Ao entrar, seu espanto foi maior ainda, a principio pensou que estava no lugar errado. Mas um grande visor de plasma a sua frente dizia (em várias línguas): “Bem vindo ao Centro Internacional Evangélico! Aqui tem uma igreja especialmente decorada para suas necessidades”.
Então, contornou o que parecia um jardim com um lago, bem atrás da tela de plasma e viu um imenso salão, com poucas pessoas circulando, devido aquele horário tão cedo. E bem no centro um telão projetava a programação do Dia:
“Às 10h, 13h e 18h – Templo multiplex 1 – Recarga espiritual;
Às 12h – Templo Multiplex 2 – Receitas Bíblicas de Belezas: descubra como as mulheres bíblicas ficavam bonitas
Às 17h – Templo Multiplex 2 – Show como “RAP CRISTTUS”;
As 15 - Templo Multiplex 3 – Clube dos empresários Gospell – A Bênção para sua Empresa”;
Ás 17h - Templo Multiplex Principal Mega show com Heavy Gospel e Metal Paise;
Agora: Gideão Lan-House – Batalha Espiritual virtual on-line – Vença o Diabo pela Internet”.
Quando terminou de ler aquelas mensagens, o Sr. Abel sentiu uma dor no peito. Olhou ao redor e viu um néon piscando: “Centro de Alimentação Rápida”. Caminhou com dificuldades e se apoiou no balcão. Estava chocado com tantos absurdos. O atendente veio perguntar o que ele queria. Grosseiramente disse que pedisse logo, pois se ficasse ali parado atrapalhava os outros clientes. Perguntou pela escola dominical e o atendente respondeu:
“-Tem não Tiozão! Esse barato de Escola é só na prefeitura e de segunda a sexta. E que só nas igrejas dos caretas que tem isso ia! Ó! Se quiser pode subir até o terceiro andar, não lan-house, fazer o download dos podcast do Erimar Tarde (O fundador da Cadeia de Templos Multiplex) e ver os shows da fé do missionário, ou bater um chat com a equipe de pastores on-line...”
Antes que o atendente terminasse de falar o Sr. Abel colocou a mão no peito, a dor aumentou e caindo disse: “Pai Amado, perdoa-os eles não sabem o que fazem...”
“Sê fiel até a morte e dar-te-ei a coroa da Vida” Apocalipse 2.10c